ENTREVISTA MIAU - Rermisson Aniceto para Costelas Felinas Editora

 


Costelas Felinas entrevista o autor miau Remisson Aniceto


1.   As mídias sociais desempenham um papel para você como autor?

As mídias sociais sempre foram importantes para mim, pois sem elas eu não conseguiria divulgar com mais consistência os meus livros publicados e tudo o mais que escrevo cotidianamente. E como escrevo muito e o tempo todo, no trabalho, ou quando acordo nas madrugadas e até mesmo andando pelas ruas, se não fosse a internet com a sua rede de blogs, sites e aplicativos disponíveis, ficaria quase impossível "salvar" e não perder as ideias que surgem a todo momento. E são as revistas, jornais, sites, rádios e outros meios virtuais que propagam a minha poesia, os meus livros, os lançamentos e onde eles podem ser comprados. No meu processo de criação textual, as mídias praticamente não interferem, porque tudo o que escrevo, seja ficção ou realidade, é original, vem da minha imaginação e das lembranças do que vivi, vi e ouvi . Quando uso os buscadores, os mais confiáveis, é basicamente para pesquisa de apoio, para tirar dúvidas relacionadas com geografia, a história do mundo e da arte, com as invenções, e com as normas da nossa língua. Não sou professor, mas me preocupo em escrever corretamente. Resumindo, sem as mídias, hoje, como saberíamos em questão de segundos sobre o que aconteceu ou está ocorrendo do outro lado do planeta?


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2. Sua obra passou por alguma mudança significativa desde o primeiro rascunho?

Sim. Todo livro meu só nasce, tornando-se físico e definitivamente palpável, após uma série de gestações. Porque sou afoito, sou impaciente e escrevo todo dia, e sempre que me vem uma ideia, preciso transpô-la para o papel imediatamente, para mais tarde dar-lhe prosseguimento. Hoje, o feicebook e o e-mail, que são os meus principais espaços para não perder essa ideia inicial, substituem o papel propriamente dito. Nem sempre tenho papel e caneta à mão. Vou, assim, escrevendo a conta-gotas, acrescentando, cortando, lapidando, até atingir as bordas e o topo. E, quando o texto ou livro está pronto, algumas vezes, insatisfeito após ler tudo o que escrevi, descarto parte do conteúdo e reescrevo a partir daquele ponto. Isso, quando não derramo tudo e recomeço. Meus livros são como fetos, cujas fases de gestação posso abortar definitivamente ou retrocedê-las ao notar alguma anomalia, para que nasçam perfeitos. E mesmo assim, depois de nascidos, percebo que ainda falhei durante o controle de natalidade. Este livro "FelizCidade", por exemplo, por diversas vezes sofreu cortes, acréscimos, migração de poemas de uma página pra outra, até ser concluído. As muitas revisões são essenciais para que um livro nasça perfeito ou com o mínimo de imperfeições. Mas a Costelas Felinas, com a conhecida maestria dos seus editores, permitiu que ele nascesse tão bonito.
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3. O que o inspirou a explorar a beleza inesperada e os momentos de poesia nas paisagens em sua obra “FelizCidade”?

Essa é relativamente fácil de responder. Desde criança, na escola, eu gostava de escrever sobre a beleza da minha terra e da minha gente nas redações que as professoras pediam. Comecei a publicar livros físicos já com mais de quarenta anos, e essa vontade continuava ali, latente, pulsante, viva. Tanto que em muitos dos meus contos e crônicas, assim como em parte da minha poesia, a minha cidade e a minha gente se fazem presentes. E a vida sofrida na roça, as brincadeiras com os amigos, e os meus amores da infância e da adolescência - ah! os amores! -, eu sentia a necessidade de registrar tudo através da escrita. E, finalmente, a saudade do meu berço, da minha mãe (que já partiu), da minha família e amigos, da minha cidade que deixei há dezenas de anos, toda essas reminiscências nunca me abandonaram. Portanto, este livro FelizCidade nasceu com todos estes ingredientes tão ricos para a minha vida. E há nele também poemas dedicados aos meus filhos e à minha neta, meus tesouros que nasceram aqui em São Paulo
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4. Como a sua experiência profissional influenciou sua percepção e sensibilidade poética, especialmente em relação às surpresas da natureza em ambientes urbanos?

Antes de vir para São Paulo em 1979, durante muitos meses trabalhei organizando a biblioteca da minha escola particular (este trabalho era para pagar as mensalidades), no ensino médio, período em que tive a oportunidade de ler e conhecer muitos autores e autores, inclusive os clássicos pelos quais me encantei. Antes, eu frequentava a biblioteca pública de Nova Era. Em São Paulo, tive que comprar livros (e quase não havia dinheiro para isso). Aqui, trabalhei no comércio e na indústria, como balconista e vendedor, cobrador, na segurança e no transporte, até migrar para a área educacional, onde estou há mais de trinta anos. Sempre lendo e escrevendo. Nestes quase 50 anos na metrópole, fui aos poucos conhecendo a sua imensa geografia, a beleza da sua arquitetura, os contrastes entre a riqueza a e a pobreza da sua gente e os seus fervilhantes espaços de arte e de cultura. Os dias e noites no trabalho e nas ruas me reservavam sempre alguma surpresa, boa ou ruim. E como sou um bom observador do meu entorno, e me emociono com os mínimos detalhes nas ruas e nos diversos ambientes de trabalho e fora dele, tudo contribuiu para tecer as poesias e as paisagens deste livro.
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5. Você mencionou que não imaginava ser um poeta. Como foi a transição de sua carreira profissional para a escrita de poesia?

Eu nunca tive esta transição da carreira profissional para a escrita da poesia. Eu não imaginava que era poeta, e talvez nem seja, mas no início dos anos 70, uma professora do primário dizia que eu seria poeta. Ou seja, segundo as palavras dela, eu ainda não era, mas seria. E gosto de acreditar, e não vou desmentir os meus amigos, amigas, os meus leitores e leitoras que compram e leem os meus livros e dizem o tempo todo que sou poeta. Até o Osvaldinho da Cuíca me apelidou de "Poeta Maloqueiro". Apelido que pegou. Eu devo estar errado; eles, não.
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6. Escrever uma obra é um ato fascinante, exaustivo ou os dois?

Para mim é sempre fascinante, e nunca exaustivo. Porque a minha escrita é livre, leve, solta, e muito prazerosa, Acontece que não escrevo por obrigação, sob encomenda, como muitos autores fazem. Escrevo, sobretudo, com alegria. Conheço escritores que escrevem profissionalmente, e que demonstram prazer com isso, mas eu não me sentiria bem tendo a obrigação de cumprir prazos e seguir regras, muitas vezes terceirizando a minha arte, vendendo-a e sem ver o meu nome na capa do livro. Há "autores" sem qualquer talento que nunca escreveram uma linha e vendem milhões de livros, e que ficam ricos e famosos com obras feitas por anônimos. Não me sujeitaria a isso, mesmo sendo muito bem pago. E há os que escrevem biografias, roteiros para filmes, documentários e novelas, e este trabalho demanda muita pesquisa, muitas entrevistas. E são bem pagos, mas não são obrigados a se esconderem, e os seus nomes aparecem nas obras. Esses, eu aplaudo.
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7. Quais são as reações mais comuns dos leitores quando eles descobrem os seus poemas e a sensibilidade que eles transmitem?

São muitas e são boas as reações que os meus poemas provocam nos leitores, principalmente nas mulheres, que são as que mais comentam nas redes, mandam áudios ou me escrevem. Também quando encontro leitores nos saraus e nas escolas, fico muito agradecido pela alegria que os meus textos - especialmente a poesia, levam aos leitores. Essa alegria se reflete em mim o tempo inteiro. Fico encantado com as crianças e suas mães e professoras, quando me agradecem depois de lerem os meus livros infantojuvenis. Esse retorno é o combustível para que eu continue escrevendo o tempo todo. Escrevendo, eu desnudo a minha alma para os meus leitores. Afinal, como o Mário de Andrade disse para o Manuel Bandeira: "Ninguém escreve para si mesmo, a não ser um monstro de orgulho. A gente escreve pra ser amado, pra atrair, pra encantar..." Discordo dele só um pouquinho, porque escrevo para mim, sim, mas escrevo também e principalmente para os outros, e todo texto precisa voar através dos livros, para chegar a mais e mais leitores.
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8. O que os leitores encontrarão em suas obras?

Os leitores encontrarão nos meus livros contos, crônicas, poesias, encontrarão histórias para adultos e para crianças de todas as idades, de todos os tamanhos e de todos os lugares. E assim como muitos podem me encontrar dentro destes livros, alguns já me disseram que estavam perdidos e se encontraram depois de ler um poema ou um conto meu. Eis aqui, na íntegra, o que uma professora e artista plástica escreveu no facebook: "Remisson, você revelou através de sua poesia o que hoje sinto de mim". O que pode haver de mais gratificante para um poeta?
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9. Você já experimentou o bloqueio do autor? Como você superou isso?

Imagino que não exista quem nunca teve um bloqueio, ou pelo menos instantes de bloqueio criativo. Eu já tive algumas dificuldades para desenvolver uma ideia, dando a ela a completude que eu gostaria, sim, mas, como já respondi noutra questão, não escrevo por encomenda, não escrevo profissionalmente, então consigo lidar melhor com estes lampejos de escuridão, ou de fraca memória, como prefiro nomear estes meus bloqueios. Sem dúvida que é frustrante quando vem uma palavra, uma linha ou uma estrofe que parece prometer muita coisa, e fico horas, dias e até anos sem conseguir desenvolvê-la. E há ideias subdesenvolvidas que parecem fantasmas: depois de esquecidas, repente, quando menos esperamos, reaparecem. E de novo não conseguimos dar-lhes a liberdade.
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10. Qual sua frase de incentivo para os autores iniciantes?

Se você quer ser um escritor ou uma escritora, leia e escreva muito, e a leitura precisa ser variada e constante, se possível todos os dias. Foi o que eu fiz desde criança, e continuo fazendo.

Mas gostaria de complementar que as escolas e as oficinas de escrita criativa e de técnicas literárias são importantes para alguém se aprimorar como escritor ou escritora, mas elas de nada valerão se não houver primeiro o desejo, a vontade e o amor pelos livros.
Muitos grandes escritores e escritoras, cujas obras são referências e objetos de estudo no mundo todo, nunca frequentaram as salas de aula de uma universidade e muito menos as oficinas de escrita criativa e de técnicas literárias. A leitura é mais importante do que tudo, é a marca inicial que, além de dar asas e alavancar a nossa inspiração, nos liberta como pessoas e como cidadãos conscientes dos nossos direitos e deveres.

Sonho

e de repente

o cãozinho deitou

e fechou os olhos

e dormiu

e sonhou

e era um sonho tão bom

como ele nunca havia sonhado

que ele continuou dormindo

e sonhando

em vez de ficar acordado

 

Utopia

Da minha vida tantos bons sonhos descartei

e sonhos vãos guardei demais n'alma doente.

Das ficções sinto que nunca despertei

e sigo em devaneio noite e dia, inutilmente.

 

É de fúteis sonhos tão extensa a minha lista,

que acordado o meu ofício é apagá-los.

À boca pequena dizem que sou niilista,

que por ceticismo jogo a vida pelos ralos.

 

Sei que preciso perder essa louca mania

— pois a vida é bela, mas não é só fantasia —

de sonhar o tempo inteiro e em desalinho.

 

Deixar de sonhar? Não, não é o que eu digo!

Só vou, desde agora, separar o joio do trigo —

e de sonhos bons tornar real o meu caminho.

 


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